segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

Vá a uma Biblioteca

 “Podemos combater a ignorância e a desinformação que alimenta o ódio. E podemos fazê-lo numa biblioteca pública”.  

Os tempos são de uma substantiva crise que se alarga do económico, ao social, ao cultural e ao espiritual. Uma crise que se vislumbra em amplos sectores da sociedade e que está a conduzir-se nos próprios fundamentos do que poderíamos chamar a decadência dos valores de uma Nação. Crise que fez emergir um caos feito de desordem, de desregulação, de disfunções várias. Uma crise que oblitera o essencial do que deveria ser uma acção política virada para a comunidade, como um sentido partilhado de valores. 

Crise formulada em desrespeito pelos valores essenciais, feitos de debate sério, informado, consciente sobre o próprio valor das pessoas e do seu contributo na sociedade. Crise feita da ideia de que qualquer informação é credível para manter uma posição ideológica. Uma crise feita sobre a decadência do conhecimento e formulada em opiniões irreconhecíveis em qualquer construção do saber, da sua curiosidade. A curiosidade pelo conhecimento, pelo acto de saber termina quando se descobre que a informação que cada um tem é diferente daquela em que se acredita. A crise que vivemos alicerça na ideia de que as nossas convicções são as únicas possíveis e que elas estão absolutamente certas. Por isso não se toleram ideias alternativas ao que cada um pensa, ao que institucionalmente se define como o certo. Não existe pois pensamento alternativo.

O caminho por aqui definido é perigoso e destrói o essencial do que significa a democracia. Este processo de caos em que nos encontramos impede que o sistema político e a sociedade sejam constituídos por cidadãos informados, por pessoas que sentem a curiosidade como forma de partilhar uma ideia colectiva sobre o futuro. Impede que cada um se sinta responsável por defender os valores que animaria uma sociedade feita da aceitação do outro. Para isso seriam precisos processos que abandonámos, Aceitação, Discussão, Debate, Igualdade, Oportunidade. Sem eles, sem o exercício da razão baseada em argumentos e factos sólidos que permitam a crítica ao próprio poder estabelecido não existe democracia.

É pois preciso uma acção capaz de mudar esta situação. Como sempre, qualquer mudança global implica uma transformação local. O que significa que é em cada um de nós que a mudança e o processo deve ocorrer. Como? Mantendo a capacidade de sermos informados, de sermos curiosos, de aceitar que sabemos pouco sobre muitas coisas e que é necessário que sejamos uma comunidade feita de diferentes perspectivas. Apenas assim se combate a ignorância e a desinformação, que são o alimento do ódio.

É preciso um sentido comunitário, de convivência com os outros, com os que nos rodeiam. E podemos fazer mais. Ler um jornal ou ver programas informativos em diferentes canais. Podemos estabelecer um diálogo com as pessoas que conhecemos e que têm um sentido diferente da escolha política e iniciar uma discussão, propor uma reflexão. Podemos ouvir. Fazendo isto e tentando entender melhor a opinião dos outros o mundo, poderá ser um lugar melhor.

E existe algo mais que todos podemos fazer. Podemos ir a uma Biblioteca, obter um librarycard e iniciar uma viagem para fortalecer a democracia. Podemos fazer da Biblioteca um lugar de encontro com vizinhos e conhecidos. Podemos encontrar livros e estabelecer uma rede de informação para melhor conhecer um assunto. Podemos fazer da Biblioteca um espaço de reconhecimento da própria comunidade. Podemos ir e visitar esse espaço e podemos recomendá-lo a diferentes pessoas. É por demais evidente que existem enormes benefícios de uma interacção com a comunidade e de ler por prazer. Recordemo-los. 

O estar sentado num espaço tranquilo feito de silêncio. O conhecer os espaços de uma Biblioteca Pública. O estar em contacto com uma ideia visual de ver pessoas procurando livros, lendo, tomando notas e aprendendo. Pessoas de diferentes espaços sociais e culturais estão sentadas juntamente, aprendendo juntas e falando umas com as outras. A Biblioteca concede esse encontro especial de ver que todos, de diferentes cores e nacionalidades se juntam com iguais oportunidades para aceder ao conhecimento e à informação. Tudo é gratuito e livre no melhor sentido das coisas. Num mundo isolado, onde é tão fácil criticar e desrespeitar os outros no anonimato da internet, as bibliotecas são um oásis propiciadores de um ambiente calmo e de comunidade. Elas são templos de conhecimento que dão as boas vindas a todos e dão substância espacial a todas as comunidades de um país.

Estamos no momento a viver um período na História, em que se não podemos estar juntos, se não podemos aprender uns com os outros, se não nos podemos respeitar mutuamente, então não teremos nenhuma democracia. A biblioteca pública está a desenvolver o seu papel para proteger e manter a nossa democracia. Ela está em cada comunidade, na linha da frente para ajudar a esse papel de conceder o acesso à informação, de promover competências de aprendizagem e de cidadania. A Biblioteca está consciente desse importante papel e orgulhosa de o realizar.
Por isso em 2019, seria muito bom que cada uma fizesse uma resolução contra a escuridão e a ignorância. Visitar regularmente uma biblioteca, utilizar o seu catálogo, o seu variado fundo de recursos. O nosso futuro, ou os caminhos do que seremos como nação depende muito disso.

Anthony W. Marx, New York Public Library. 01.01.2019 (via https://www.salon.com/)

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