segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

O livro e a leitura


 Biblioteca imaginária já o tínhamos dito, é aquilo que cada um é, o vivido e o sonhado, o combatido e o criado. Biblioteca Imaginária foram todos os leitores que procuraram criar um mundo pessoal em alternância a um outro, ou tão só construir uma inspiração para esse feito de uma banal regularidade. De todos os leitores que criaram ou tentaram fazer dos livros e das palavras uma forma de transformação do mundo e da vida, as mulheres foram as que mais procuraram, as que mais tentaram ir de encontro a essas possibilidades pelas palavras. E é enigmático que o tenham sido numa civilização fundada no Livro e construída em redor do poder masculino.

Essa procura da palavra escrita pelo público no feminino talvez nos conceda uma explicação por uma certa procura pelas histórias, esse romantismo das palavras em dias incertos. E , as palavras estão reunidas nesses temas que nos abraçam pela alegria ou pela angústia, como o são o Amor, o Tempo, o Medo e a Morte. É na linguagem que eles se encontram em nós. Os livros e as palavras sempre incomodaram o pensamento unitário, os caminhos únicos. A Inquisição e as fogueiras que se seguiram existiram sempre mais mulheres e livros que homens.

Assim anunciou-se há muitos séculos esse perigo eminente que eram os livros e os seus leitores, o conhecimento e a coragem. É verdade que nos homens a palavra é muitas vezes desprezada. Basta pensar no mundo dos políticos, as palavras para todo o engano. Algumas vezes isso também tem acontecido com as mulheres e, principalmente pela propagação do sistema de poder ao utilitarismo ideológico. Fiquemo-nos pela incineração dos livros que tantos admiraram como se isso matasse as ideias lá inscritas.

A leitura foi pois durante muito tempo uma actividade pouco tolerada. A leitura traz-nos a reflexão, a possibilidade de formular uma opinião, a possibilidade de ser um dissidente da realidade social e política. Numa palavra um leitor pode aceder a essa altura única que é a de poder ser a voz que incomoda a maioria e os seus privilégios. 

A leitura progrediu muito a partir do momento que as tertúlias e os cafés divulgaram uma nova forma de sociedade. Essa sociedade burguesa que com o tempo desdenharia dos livros, pois a sua composição de boçalidade não se adequava à representação e à linguagem de vida. Sobre esse valor único do livro, transformador e mágico disse-o Guy Montag nessa obra de referência, Fahrenheit 451, " um livro é uma arma carregada na casa ao lado. Queima-se. Tira-se a bala da arma. Abre-se uma brecha no espírito do homem."

Imagem: Copyright, Peder Severin Kroyer, Roseiral, 1893, Fine Art Society, Londres, Bridgeman Giraudon.

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