Se são os livros um
coração para dentro de algo a descobrir, a imaginar em nós e a reportar em
franjas de real, poderíamos vê-los como algo a preservar, a prender em nós,
como uma oferta de um silêncio maior, íntimo? Poderiam eles ser nessa austeridade
pública, nessa linha de algo especial e único um elemento em nós, como o pode
ser um beijo? Max Frisch disse-nos um dia que os livros deviam ser preservados
em nós, para que assumissem uma dimensão especial, acima de qualquer
vulgaridade. Vivê-los como um tesouro guardado no coração, fruto dessa obra
individual que foi compor abnegadamente essa linha do corpo em instantes de
imaginação.
Compostura e minimalismo no interior do nome das coisas essenciais,
como a identificação de um coração que nos preenche, nos identifica numa
multidão de vulgaridades. Just like a kiss. Sim, a leitura realizada como
actividade de informação, de lazer, mas também com a necessária atenção àquilo
que nos pode dar uma tranquilidade, uma forma imaginada e lúdica de ver o
mundo, os outros.
A leitura vivida
nessa fronteira de algo nobre e formativo poderá produzir no leitor sinais de
autoconfiança, o que conduzirá inevitavelmente à formalização de um pensamento,
sempre devedora de uma coragem de ser livre. Que leitores procuram o estímulo para
o seu coração nas obras literárias para si próprios e para a sua vida? Alguns homens,
mas sobretudo são elas que o fizeram, que ainda o fazem. Os grandes leitores são
mulheres, pois essa é uma ideia genérica que a história social e cultural dos
últimos dois séculos nos diz de forma inequívoca, assim como a Arte.
Esta
dá-nos em múltiplos criadores essa fantasia de leitoras, de diferentes
idades,
geografias e atmosferas nesse consolo e deslumbramento de olhar as
palavras,
para mais tarde aguardarmos os seus olhos levantados das imagens dos
sinais
gráficos. Sim, os livros são como os beijos. Frescos, matinais, austeros
e únicos na construção de uma intimidade no interior de nós.
Imagem: Copyright – J.
J. Henner, Mulher a ler, C. 1880-90, Museu d’ Orsay, Paris.
Fonte: Elke Heidenreich, “Do perigo
de as mulheres lerem demasiado”, in Stefan B0llmann, Uma história da leitura
desde o século XIII ao século XXI, Círculo de Leitores, Lx: 2005.
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