domingo, 31 de março de 2019

Os livros...

 

Se são os livros um coração para dentro de algo a descobrir, a imaginar em nós e a reportar em franjas de real, poderíamos vê-los como algo a preservar, a prender em nós, como uma oferta de um silêncio maior, íntimo? Poderiam eles ser nessa austeridade pública, nessa linha de algo especial e único um elemento em nós, como o pode ser um beijo? Max Frisch disse-nos um dia que os livros deviam ser preservados em nós, para que assumissem uma dimensão especial, acima de qualquer vulgaridade. Vivê-los como um tesouro guardado no coração, fruto dessa obra individual que foi compor abnegadamente essa linha do corpo em instantes de imaginação.

Compostura e minimalismo no interior do nome das coisas essenciais, como a identificação de um coração que nos preenche, nos identifica numa multidão de vulgaridades. Just like a kiss. Sim, a leitura realizada como actividade de informação, de lazer, mas também com a necessária atenção àquilo que nos pode dar uma tranquilidade, uma forma imaginada e lúdica de ver o mundo, os outros.

A leitura vivida nessa fronteira de algo nobre e formativo poderá produzir no leitor sinais de autoconfiança, o que conduzirá inevitavelmente à formalização de um pensamento, sempre devedora de uma coragem de ser livre. Que leitores procuram o estímulo para o seu coração nas obras literárias para si próprios e para a sua vida? Alguns homens, mas sobretudo são elas que o fizeram, que ainda o fazem. Os grandes leitores são mulheres, pois essa é uma ideia genérica que a história social e cultural dos últimos dois séculos nos diz de forma inequívoca, assim como a Arte. 

Esta dá-nos em múltiplos criadores essa fantasia de leitoras, de diferentes idades, geografias e atmosferas nesse consolo e deslumbramento de olhar as palavras, para mais tarde aguardarmos os seus olhos levantados das imagens dos sinais gráficos. Sim, os livros são como os beijos. Frescos, matinais, austeros e únicos na construção de uma intimidade no interior de nós.

Imagem: Copyright – J. J. Henner, Mulher a ler, C. 1880-90, Museu d’ Orsay, Paris.
Fonte: Elke Heidenreich, “Do perigo de as mulheres lerem demasiado”, in Stefan B0llmann, Uma história da leitura desde o século XIII ao século XXI, Círculo de Leitores, Lx: 2005.

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